quinta-feira, 19 de abril de 2012

O Rio de Janeiro continua sendo...

Quinta da Boa Vista, pertinho da casa do Renato:

Foi no final de semana retrasado, feriado da semana santa. Eu embarquei na sexta-feira, para voltar no domingo. O tempo seria curto, mas eu sabia que valeria a pena.

sabe essas amizades que começam por acaso, pela internet, sem muita intimidade, e de repente... Você e essa pessoa se tornaram amigos de verdade. Mesmo sem se falar todos os dias. Mesmo sem confidenciar detalhes do seu dia, todos os dias.

Aconteceu comigo. Um amigo do Rio de Janeiro, que há muito despertava minha simpatia, passou recentemente por um divórcio - eu ia colocar algum adjetivo aqui, mas acho que a palavra por si só dispensa o uso de qualquer um. Eu há muito não ando no meu auge, cabisbaixa a maior parte do tempo.

A ideia surgiu dele, e no começo confesso que me assustou um pouco, mas... Certos riscos valem a pena ser corridos, principalmente quando se anda tomado pela apatia, como eu estou. E de repente era isso: dentro de um mês, eu iria ganhar de presente uma viagem para o Rio.

Eu poderia dizer que minha ficha demorou a cair, mas isso seria mentira, porque acho que estou esperando o barulho até agora. Não caiu. Mas eu posso falar um pouco sobre o que aconteceu lá, enquanto isso.


Há pelo menos uns 12 anos eu não punha os pés no Rio de Janeiro. A última vez foi quando minha vó ainda estava viva, e eu devia ter uns 16 anos de idade. Mas antes disso, principalmente antes dos meus pais se separarem, eu estava lá todos os anos, duas vezes por ano, na casa da mãe da minha mãe, também conhecida por Gelta.

Nunca fiz muito o perfil de turista, então em todo esse tempo na terrinha, o meu mundinho era o bairro do Catete. Praia? Do Flamengo. E porque era muito, muito perto. No caminho do apartamento da mina avó, que tinha uma grande janela com vista para a favela, para a praia, o jardim do palácio do Catete era praticamente obrigatório. Eu tenho parentes lá, vocês sabem. Morando nas casas onde moraram os escravos. E é de matar de inveja.

Resumindo, esse pequeno pedaço é parte da minha infância, e desperta quase tantas lembranças quanto o bairro em que eu morei até os dezesseis anos.

Conheci o bairro de São Cristóvão, que é onde esse amigo mora. Depois entrar por uma portinha quase imperceptível no meio de tantas outras e atravessar um corredor estreito e interminável, me senti meio Alice in Wonderland ao dar de cara com uma simpática vila de casinhas juntinhas uma da outra. E pensei comigo como seria possível aquilo tudo caber naquela portinha pela qual passamos. Inacreditável.

Conheci duas gatas maravilhosas e me apaixonei. E elas se apaixonaram por mim também, o que acabou gerando um grande stress na casa por parte de uma delas, que se escondeu por todo o final de semana.

Fui maravilhosamente bem recebida com vinho e chocolates por uma pessoa que não esperava nada de mim, além da minha companhia, e essa sensação é simplesmente indescritível para tentar descrever.

E no meio de todas essas coisas, a mais marcante de toda a viagem. Visitar o bairro da minha falecida avó Gelta. Eu sempre soube que a emoção ia tomar conta de mim quando eu pusesse de novo os pés nos mesmos lugares em que pisei incontáveis vezes ao lado dela, mas nem mesmo eu poderia imaginar que seria com tanta intensidade.

Ao sair da estação do metrô e colocar os olhos no Largo do Machado, eu não pude conter as lágrimas que foram disfarçadas por enormes óculos escuros. A primeira vez depois de tantos anos, e a primeira vez em que eu sabia que não ia encontrá-la ali. Mas o mais estranho é que eu encontrei. De uma maneira inexplicável, é como se ela nunca tivesse saído dali. Aquele lugar é ela. Não tem como dizer de outra maneira.

Os supermercados e farmácias em que já entramos tantas vezes, as galerias... E até mesmo as lojas que não estavam ali da última vez em que eu estive. Mesmo isso. Nada ali mudou sua identidade, por mais diferente que possa estar. Está igual.

E quando o raciocínio dizia de novo que eu não ia me encontrar com ela, e não ia sentir o cheiro do seu apartamento, ou dos trocentos pratos de comida que ela sempre fazia quando íamos visitá-la, dos tecidos que ela guardava em casa, e mesmo dos produtos de limpeza que usava. Era outro golpe, e eu chorava mais.

Sempre fui uma pessoa nostálgica, mas esse nível de experiência foi muito além do que eu poderia imaginar. E quase além do que eu poderia suportar. Foi arrebatador. E chapante. E depois, anestesiante - se é que essa palavra existe.

A questão é, eu vivenciei uma emoção que nem eu sabia que ainda era capaz de viver, e esse é o tipo de coisa que faz a gente pensar. Agora, em casa, depois de me adaptar à minha velha realidade, ainda não sei dizer o que eu tirei disso tudo.

Quer dizer, é fácil colocar em "itens" o que eu tirei. Conheci um grande amigo, e embora eu tenha sido um bocado amarga com ele, espero que ele entenda que essa é uma condição minha agora e que não foi só com ele, eu tenho sido amarga com meus melhores amigos, e espero que tenha gostado da minha visita. Conheci aquelas duas gatas lindas e fofas. Comi pizza à noite e torrada de manhã. Comemos pipoca assistindo Ranma 1/2 e The Black Adder - impagável! -. Visitei o Catete e dei um pulo na praia - breve visita, sem nem colocar os pés na areia -. Mas as emoções ainda estão sendo processadas. Talvez esse processo nunca termine. Talvez somente se renove em uma oportunidade em que eu pise lá novamente. E no dia que isso acontecer, eu volto para contar para vocês.


Catete:
porta do prédio da minha avó.

esquina da rua Pedro Américo, onde minha avó morava.
 Jardim do palácio do Catete:




depois de abandonada e interditada por muitos anos, a gruta hoje está linda.





as antigas casas dos escravos (eu tenho parente que mora aí, é sério)

vista do Pão de Açucar da passarela da praia do Flamengo.



um dos grifos no topo do palácio.

Largo do Machado <3

Freeda, a oferecida.

não se enganem, as coisas não estavam nada bem.

Princesa, da realeza.
 Quinta da Boa Vista, último dia de manhã:


uma das poucas vistas no parque, a única que consegui fotografar antes das minhas pilhas falecerem.

Um comentário:

  1. Que texto maravilhoso!
    Não lembro de nada amargo além do vinho!!
    Agora é juntar dinheiro no cofrinho de gato (quero review) e nos mandarmos para Sorocaba!!

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